A Agência Nacional das Telecomunicações (Anatel) e as empresas que ofertam internet no país, definitivamente, conseguiram ofuscar o processo de impeachment da presidente Dilma Roussef nas últimas semanas. Afinal, eles defenderam um modelo inédito no país até então: a franquia limitada de acesso à rede mundial de computadores. E é claro que isso causou muita polêmica.
A Anatel chegou a afirmar que a era da internet ilimitada havia chegado ao fim. Depois recuou. Hoje, o comércio de franquias com limites está suspenso por tempo indeterminado e as empresas e a Anatel devem retomar o debate com a sociedade.
Aliás, segundo a Anatel, essa será a segunda vez que a sociedade será chamada para debater o assunto. Em 2013, quando o assunto começou a ser discutido, houve uma audiência pública sobre o tema e não houve objeção ao modelo de franquia. É o que afirma a superintendente de relações com consumidores da Agência Nacional das Telecomunicações (Anatel), Elisa Leonel, em entrevista a Consumidor Moderno, durante o XIII Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor. “Na época do debate, recebemos 30 contribuições e nenhuma previa negar a franquia. O fato é que o debate foi aberto para a sociedade e foi o que a Anatel ouviu da sociedade”, disse Elisa durante o seu painel. Depois, suavizou o discurso.
Entre outros assuntos, ela defendeu a participação de empresas como Netflix. Veja a entrevista a seguir.
Consumidor Moderno – Em sua apresentação no Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor, a senhora afirmou que a etapa de debate com a sociedade em relação foi cumprida em 2013. É isso mesmo?
Elisa Leonel – Sim, a etapa foi cumprida. Ocorre que, desde 2013, muita coisa mudou no setor de telecomunicações. A banda larga tem muito mais impacto na vida dos consumidores. A Anatel está sensível a toda essa discussão e vai reabrir o diálogo para avaliar se há algo a avançar na regulamentação da agência. Claro, tudo dentro dos limites da nossa competência legal. Mas, o conselho diretor está decidindo sobre reabrir a discussão sobre o modelo de franquias e a prestação da banda larga fixa.
CM – Sobre as questões técnicas para a criação da franquia, os argumentos serão mantidos ou devem surgir outros?
Elisa – Temos uma série de questões técnicas a avaliar. Há informações que as empresas vão ter que trazer para a mesa, que nem mesmo a Anatel tem hoje e que incluem questões econômicas e também a questão do modelo de prestação de serviço de uma maneira geral.
CM – Quais seriam essas questões técnicas exatamente?
Elisa – O impacto da rede, principalmente quanto ao uso. Elas (empresas) estão alegando que poucos consumidores consomem muito da rede e geram uma necessidade de investimento muito grande. Elas têm que apresentar esses números, além da dimensão técnica e econômica, para, enfim, a Anatel avaliar e discutir com a sociedade.
CM – Mas esses argumentos não foram apresentados no passado?
Elisa – Lá em 2013 não foram apresentados.
CM – Mas elas não foram questionadas sobre esses argumentos técnicos?
Elisa – Há um processo de consulta pública e as prestadoras tanto quanto a sociedade têm direito de participar da consulta pública e trazerem os argumentos que quiserem. Esses argumentos, esses estudos mais aprofundados, à época, não foram feitos.
CM – Há modelos com ou sem franquia ao redor do mundo. Na sua opinião, qual deve prevalecer no país?
Elisa – O tempo vai dizer qual o modelo de banda larga que o setor empresarial e a regulação vão possibilitar. Mas o nosso olhar de agência reguladora sempre vai ser para proteger o consumidor, seja qual modelo sobreviva.
CM – Um dos argumentos das empresas é que os modelos de negócios de OTTs (Over the Top Content ou o Netflix, por exemplo) atrapalham o negócio da internet no país. É o caso dela serem chamadas para discutir o tema também?
Elisa – Com certeza. As OTTs são parte interessada da discussão de um modelo de banda larga, pois elas utilizam a rede de telecomunicações e também devem apresentar os seus estudos e argumentos.
CM – Mas elas fizeram parte do debate anteriormente?
Elisa – Em 2013, OTT não era um segmento que tinha muita relevância. Agora, imagino que sim.