Richarlison foi o destaque na estreia da seleção brasileira na Copa do Mundo do Catar. Os dois gols no primeiro jogo contra a Sérvia – sua primeira partida em Copas – fizeram o camisa 9 cair ainda mais nas graças da torcida. Mas não é só o posicionamento em campo do atacante que tem chamado a atenção para Richarlison, de 25 anos. Fora de campo ele é engajado em questões raciais e sociais, e não tem medo de falar o que pensa, inclusive em English, my friend.
O comportamento de um dos representantes da nova geração da seleção brasileira é engajado em causas sociais. E não se trata de uma atitude isolada, mas reflexo de uma geração: a Z. Richarlison incentivou a vacinação contra a Covid-19 e é embaixador do programa USP Vida; protestou contra o racismo após as mortes de George Floyd nos Estados Unidos e do adolescente João Pedro, morto em uma operação policial no Rio; defende causas ambientais – e pediu buscas por Dom Phillips e Bruno Ribeiro.
Leia Mais: Como atrair a nova geração de consumidores do futebol?
Na primeira entrevista coletiva na Copa, Richarlison criticou as restrições impostas pela Fifa ao uso da braçadeira “One Love”, com cores do arco-íris. “Independentemente de qualquer coisa, temos que respeitar. Não sei o que vão fazer aqui, se vão entrar com faixa, mas eu apoio qualquer ato. Vivemos num mundo perigoso, onde não podemos ter opiniões. Seja contra o racismo ou a favor do movimento LGBTQIAP+. Eu apoio qualquer movimento”.
Para Gabriel Tavares, consultor de pesquisas da WGSN, a postura pública de Richarlison é um exemplo da visão de muitos da Geração Z. Eles realmente entendem que essas ações – tanto individuais quanto coletivas – têm um peso muito grande. “O acesso à informação que eles têm hoje fundamenta a crença na capacidade deles de influenciar o que acreditam, desde políticas públicas até comportamentos de marca”.
Assine nossa newsletter e fique atualizado sobre as principais notícias da experiência do cliente
O atacante Kylian Mbappé, ídolo da atual campeã mundial, a França, tem apenas 23 anos. Ele se recusou a participar de algumas ações publicitárias com os patrocinadores por não querer associar sua imagem a determinadas marcas. Segundo o jornal Le Parisien, Mbappé não deseja ver seu nome ligado à Coca-Cola e KFC (junk food) assim como à BetClic (de jogo de azar). O camisa 10 francês exige mudanças no contrato de uso de direitos de imagem dos jogadores com a federação francesa, atualizado pela última vez em 2010, e ter mais controle sobre si.
“A busca por autenticidade marca muito o comportamento dessa geração. As pessoas são marcas hoje, então digamos que esse collab, esse cobranding precisa fazer muito sentido para que o consumidor confie e não haja desgaste para nenhuma das 2 marcas – tanto dessa pessoa que tem um poder de influência quanto da empresa à qual ela se vincula”, aponta Tavares.
Outro jogador brasileiro que também se coloca é Vinícius Jr. Um dos destaques na segunda partida da seleção brasileira na Copa do Catar (com direito a um belo um gol anulado), ele usa muito suas redes sociais para falar sobre oportunidades e contra a discriminação. Recentemente, ele, que joga no Real Madrid, foi vítima de racismo na Espanha, gerando um movimento gigante #BailaVini #BailaViniJr e transformou isso num vídeo tão inspirador quanto seus passes e gols.
Leia Mais: Marketing de influência e Copa: qual a melhor jogada?
Essa geração é a primeira do futebol que se comunica através das redes sociais, mais do que em uma relação mediada com a imprensa, lembra o jornalista esportivo Bruno Guedes. Se por um lado isto é positivo, por outro perde-se a espontaneidade do contato “desprevenido”. “Avalio que é uma geração muito bem treinada para se comunicar. Mas quando a gente vê o Richarlison, por exemplo, que tuíta como fala, é perceptível que ele é autêntico e se posiciona – e não se esconde”.
“A geração Z começou a ser socializada em um mundo que é uma disputa constante por atenção, em que se misturam marcas, pessoas, personas e personalidades. Para outras gerações, como Millenials, Boomers pode ser muito confuso, mas é uma noção que a Geração Z tem, de que deve fazer valer a atenção que recebe. Essa consciência de fazer isso valer de alguma forma é muito forte dentro deles”, explica Tavares.
O futebol desafia a forma como a Geração Z se organiza, muito mais no contato um a um, individual e personalizado, aponta o pesquisador da WGSN. “Ela precisa de permeabilidade, de porosidade, de poder influenciar de alguma forma isso e acho que o futebol, da forma que ele é construído socialmente, acaba se tornando um pouco impositivo”.
Por outro lado, o Brasil se tornou nos últimos anos um país de jogadores de jogos digitais, as pessoas estão consumindo marcas de futebol dentro de ambientes digitais. Para Tavares, o que pode aproximar ainda mais a Geração Z da ‘paixão nacional’ é a multiplicidade de formas de participar da Copa. Um dos exemplos é Casimiro. As transmissões dos jogos do Mundial pelo Youtube bateram recordes de audiência. O streamer teve mais de 5 milhões de pessoas assistindo às lives da seleção na Cazé TV, ao narrar os jogos com toda a verve que o tornou um dos queridinhos do Brasil em 2022.
“Isso não é à toa, é porque o conteúdo não vem embalado como futebol, o conteúdo é consumido a partir de outra perspectiva. O entretenimento está sendo pulverizado cada vez mais, as pessoas buscam outro tipo de entretenimento, o que faça mais sentido para ela. O futebol é um traço da nossa cultura como brasileiros, mas a forma que nós consumimos mudou”, finaliza Tavares.
+ Notícias