Quem não utilizou aplicativos para pedir comida em casa durante o período de lockdown? Parece uma experiência natural para quem viveu a pandemia e o processo acelerado de digitalização das rotinas. Mas, as pessoas cegas, por exemplo, não tiveram essa oportunidade, porque os apps não são adaptados para elas.
Quem não transferiu o escritório para casa e participou de reunião atrás de reunião de em plataformas de “meeting”? No início da pandemia, as pessoas surdas não conseguiam participar, porque não eram disponibilizadas ferramentas de legenda, por exemplo.
Confira a cobertura completa do CONAREC 2022
No CONAREC 2022, Carolina Ignarra, CEO e Sócia-Fundadora do Grupo Talento Incluir, falou sobre as barreiras do consumidor com deficiência. Ela foi categórica em afirmar que as tecnologias para tornar o mundo digital mais acessível já existem há muito tempo, o que falta é pensarmos soluções, pensarmos a inovação de forma inclusiva. E isso, segundo a CEO, não acontece ainda porque as pessoas com deficiência são invisíveis para a sociedade, para o mercado e para a maioria das empresas.
“Quantas pessoas estão ficando de fora? É isso que precisamos nos questionar. O que está faltando é o pensar inclusivo. A gente fala de inteligência artificial, de ferramentas de atendimento. E se a gente já pensasse todas essas soluções incluindo o consumidor com deficiência? A gente não precisaria de um momento de crise como a pandemia, para ver que tantas pessoas estavam ficando de fora”, explicou Carolina.
A sócia-fundadora do Grupo Talento Incluir disse que ainda não temos bem contabilizado o número de pessoas com deficiência no Brasil. De acordo com o dado do último Censo, de 2010, estimou-se que 24% da nossa população teria algum tipo de deficiência. O percentual pareceu superdimensionado e chegou-se à conclusão de que as perguntas em relação a isso não estavam sendo bem feitas. Para Carolina Ignarra, levando isso em consideração, fica claro o maior problema do consumidor com deficiência: ele não é visto, não é contabilizado e diante disso, não é lembrado, não é incluído, não é pensado pelas marcas.
Apesar da falta de informações precisas, a CEO afirma que o Grupo Talento Incluir, que existe há 15 anos, vem crescendo absurdamente. No primeiro ano da pandemia, teve um crescimento de 32%, no segundo ano 62%. Ela lembrou que quem está olhando para esse consumidor, está colhendo ótimos frutos.
“A gente consome, a gente existe, estamos à disposição de um mercado que ainda não olhou para a gente. Quem olhar antes, ganha antes, ganha mais”, enfatizou Ignarra.
Ninguém cria uma empresa para humilhar alguém
Carolina trouxe alguns casos para ilustrar os problemas que os consumidores com deficiência acabam enfrentando diariamente, mesmo ao lidar com grandes empresas e grandes marcas. Ela contou que assistiu à uma palestra no Expo São Paulo, em que o palestrante, um homem cego, contou que demorou mais de uma semana para conseguir fazer o pedido de um berço para o seu filho que ia nascer:
“Ele queria comprar um berço na internet e só queria escolher a cor do berço, queria que fosse branco; e o tamanho, para caber no quartinho do futuro bebê. Como não conseguiu fazer isso pela página, entrou em contato com a loja. Só depois de dois ou três dias, a inteligência artificial conseguiu responder o email dele. Depois de mais três dias falou com um atendente humano e fez a descrição do pedido. Conclusão, o berço chegou na cor caramelo, mas ele não sabia. Montou o berço, a criança nasceu e só depois conversando com uma pessoa que foi visitar, descobriu que o berço não era branco. Imagina a humilhação?”.
A CEO do Grupo Talento Incluir disse acreditar que ninguém que abre um negócio, pretende humilhar ninguém, simplesmente não pensa em incluir o consumidor com deficiência. Ela lembrou que hoje, no Brasil, a pessoa com deficiência é protegida por lei e tem o direito de ter acesso aos produtos e serviços que desejar. O problema, segundo ela, é que quando as empresas encaram como “obrigação” vender para a pessoa com deficiência, a mudança de pensamento não acontece.
“A obrigação nunca movimenta pessoas. Mudanças só acontecem de fato por convicção, porque você entende que é o certo a se fazer. A partir daí você define que o seu negócio quer atender gente. Quando você convive com uma pessoa com deficiência na sua empresa, por exemplo, histórias como a do cara do berço te emocionam muito mais, te mobilizam de outro jeito. Por isso que a empregabilidade da pessoa com deficiência é uma estratégia importante nesse processo de mudança de pensamento”, acrescentou Carolina Ignarra.
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